segunda-feira, 23 de março de 2009

Bolg Joint: O aproveitamento dos espaços públicos

Não tenho muita coisa a dizer em relação a este importante tema proposto pelo colega Ronny Moreira.
Pertencemos a um País onde ainda não há muita sensibilidade em relação ao que é bem público.
Escolas destruídas, portas arrombadas, paragens de autocarros destruídas, materiais diversos utilizados em benefício privado, são práticas amiúdes na nossa sociedade.
Precisamos trabalhar no sentido de incutir nas pessoas as boas práticas relacionadas com a utilização dos bens públicos tão necessários ao nosso progresso. É o tão almejado desenvolvimento do nosso Capital Social, tão ou mais importante que o Capital Físico ou Capital Humano para o nosso crescimento e desenvolvimento.
Os espaços públicos, como escolas, centros juvenis, cinemas entre outros devem ser protegidos e utilizados a bem da comunidade.
Cabo-Verde como um País pobre que faz um grande esforço na mobilização de recursos para a criação dessas infraestruturas que são indispensáveis ao seu desenvolvimento não se pode dar ao luxo de ver esses mesmos espaços a degradarem-se ou a serem degradados na mesma velocidade com que conhecem a luz do dia.
O associativismo juvenil pode desempenhar um papel fundamental na promoção de actividades que permitam um aproveitamento adequado desses espaços. Mas também tem um papel importante na sua preservação através da criação de programas de recuperação de espaços públicos.
As associações juvenis podem ser um importante parceiro dos poderes públicos na prossecução de objectivos de melhor gestão, de recuperação e de preservação dos espaços públicos.

terça-feira, 17 de março de 2009

Ainda a propósito da visita de José Sócrates a Cabo-Verde


Nos últimos dias muito se tem falado sobre a famosa viagem do Primeiro Ministro de Portugal, José Sócrates, a Cabo-Verde, com uma comitiva de 120 pessoas, entre Ministros, Secretários de Estado, Empresários entre outros.


Nunca na minha vida ouvi tantas asneiras da parte de alguns analistas portugueses quando analisavam a visita de Sócrates a Cabo-Verde.

E só para citar um exemplo num debate televisivo vi um jovem ( coitado, não sabia o que dizia) a dizer que não percebia o que é que Sócrates ia fazer a Cabo-Verde para no fim rematar que ele foi lá distribuir os computadores magalhães enfermos de defeitos para acrescentar mais problemas aos muitos que Cabo-Verde já tinha como a malária, a ébola e as dificuldades do quotidiano.

Outros disseram que Sócrates fortemente contestado em Portugal foi lá para receber carinho do Povo cabo-verdiano para se sentir grande no meio de gente pobre e pequeno.

Esse jovem não imagina nem de longe e nem de perto que os indicadores de saúde em Cabo-Verde são melhores do que alguns países europeus e que a malária e a ébola não fazem parte do nosso vocabulário. De resto, não vale a pena tecer mais comentários de tão pobres que são essas opiniões.

Do lado de Cabo-Verde doeu-me ver que muitas pessoas, entre políticos, bloggers, analistas, preferiram pôr enfase em questões menores, outras mesquinhas até, e não em questões essenciais . Muitos preferiram falar dos defeitos do Magalhães, da propaganda política, do passeio, das lagostas...

Uma coisa ninguém pode negar: essa visita foi um sucesso a todos os níveis. Pareceu-me ser muito bem organizada pelas autoridades cabo-verdianas, com todos os pormenores para que nada falhasse. Acho que desde de 1975 nunca nenhum Chefe de Estado ou de Governo fez uma visita oficial a Cabo-Verde que se traduziu em tantos resultados práticos como essa visita do Chefe de Governo de Portugal.

Muitos disseram que não se justificava uma tão grande comitiva para Cabo-Verde dada a relativa diminuta importância económica do arquipélago. Cabo-Verde é uma pequena economia aberta com aproximadamente 530 mil habitantes (cerca de 0,17% da população da Euro Àrea) e com um Produto Interno Bruto (PIB) que representa apenas 0,01% do PIB da Euro Àrea.

Em Portugal vivem milhares de cabo-verdianos que dão a sua contribuição para o desenvolvimento desse País. Em Portugal estudam milhares de estudantes cabo-verdianos. Em Cabo-Verde há importantes investimentos de Portugueses principalmente no sector financeiro.

Cabo-Verde não tem o petróleo de Angola e da Venezuela, nem ouro e nem diamante. Mas somos um País com estabilidade política, social e económica, a nossa democracia é uma referência no mundo, temos grandes potencialidades a nível do turismo, e uma posição geo-estratégica importante.

Cabo-Verde tem sido um bom aluno. Sempre geriu bem os recursos que foram postos à sua disposição. Num contexto de total ausência de recursos naturais o País apostou fortemente na educação, na qualificação e valorização dos recursos humanos e fez um bom percurso ao longo desses anos de independência. Cabo-Verde deve ser portanto um orgulho para Portugal.

A importância económica de Cabo-Verde pode ser diminuta. Mas só os laços históricos, a proximidade cultural, incluindo a língua comum, e a proximidade geográfica justificam que as duas Repúblicas aprofundem os laços de cooperação, que cada vez mais vai passar a ser parceria estratégica, porque Cabo-Verde também já tem muito a dar a Portugal.

Não podia terminar sem antes referir que foi com gosto que ouvi o Dr. Basílio Horta, Presidente da Agência de Promoção de Investimentos de Portugal numa entrevista na RTP Àfrica quando confrontado com a questão se justificava uma tão grande comitiva para Cabo-Verde ele respondeu mais ou menos isso: os investimentos não podem ser avaliados só em termos quantitativos mas também em termos qualitativos. Consideramos que investir em Cabo-Verde é um investimento na qualidade.

segunda-feira, 2 de março de 2009

A autocensura, o anonimato e as máscaras na sociedade cabo-verdiana

Cabo-Verde conquistou a sua independência no dia 05 de Julho de 1975. O Partido Africano da Independência de Cabo-Verde (PAICV) governou em regime de partido único de 1975 a 1990.

No dia 13 de Janeiro de 1991 realizaram-se as primeiras eleições livres e democráticas. O Movimento para a Democracia (MPD) venceu essas eleições e Governou até 2000. Em 2001 o PAICV reconquistou o poder e governa até hoje.

Volvidos pouco mais de três décadas sobre a independência o País cresceu e desenvolveu-se muito nos vários domínios mas ainda tem uma elevada taxa de desemprego e pobreza, e o Estado desempenha um papel fundamental a vários níveis.
Adquirimos o estatuto de País de Desenvolvimento Médio, mas a luta pela sobrevivência ainda é intensa. Persistem enúmeros constrangimentos à obtenção da liberdade, que vão desde a falta de recursos materiais e educacionais a impedimentos psicológicos ao sucesso.
Somos uma democracia jovem, muito jovem, com apenas 18 anos de vivência democrática. E, sendo assim, um País que ainda não conseguiu libertar-se de certos estigmas do colonialismo e do regime anterior.

Cabo-Verde é referenciado como um exemplo de democracia em África e no mundo, porque a transição em 1990 foi pacífica e exemplar e desde então, com mais ou menos turbulência realizaram-se as várias eleições, já houve alternância no Poder, e as instituições democráticas funcionam.

Não obstante, a luta política que ainda se faz em Cabo-Verde deixa muito a desejar. Em campanhas eleitorais discute-se tudo menos os projectos. Os discursos são violentos com ataques pessoais, calúnias e difamações de vária ordem. Fala-se da esposa, do esposo, da progenitora, dos filhos, das heranças e das fortunas mas não se fala do essencial que é Cabo-Verde. No Parlamento, centro do debate político em Cabo-Verde, alinha-se pelo mesmo diapasão.

Estamos a progredir e hoje estamos muito melhor do que ontem e amanhã, decerto, estaremos muito melhor do que hoje.

A sociedade cabo-verdiana no seu curto trajecto de País livre e independente é ainda marcada por esses dois acontecimentos mais importantes da sua história: a independência e a democracia, este reclamado pelos ventoinhas como obra sua, e aquele ligado indelevelmente ao PAIGC/CV.

É ,por isso, que desde que se instaurou o 13 de Janeiro como dia da Liberdade e da Democracia, todos os anos por ocasião dessa efeméride travam-se intensos debates em Cabo-Verde tendo de um lado o MPD e os seus sequazes a dizerem “ nós é que somos democratas, nós é que trouxemos a Democracia para Cabo-Verde” e do outro lado o PAICV e os seus sequazes a dizerem que o dia da Liberdade e da Democracia não devia ser o dia 13 de Janeiro, dia em que se realizaram as primeiras eleições, mas o dia em que o famoso artigo 4º da Constituição caiu pondo fim ao regime do Partido Único e dando início ao Multipartidarismo.

Como se esse debate fosse fecundo e permitisse resolver os principais desafios que o País enfrenta nos dias que correm, como a produtividade, a competitividade, o desemprego e a pobreza.

A sociedade cabo-verdiana é, portanto, uma sociedade muito partidarizada com o PAICV e o MPD a dominarem o sistema. Não surgiu a tão almejada terceira força.
Todas as forças políticas que até agora tentaram afirmar-se como terceira via estavam condenadas à nascença porque nasceram em circunstâncias especiais, através de dissidências e , por conseguinte, com objectivos de vingança e não estribados em projectos de sociedade credíveis. Acabaram por sucumbir e como “ os bons filhos à casa tornam” cada qual voltou à sua casa.
Não é de estranhar que só a UCID conseguiu sobreviver até agora, mas afirma-se cada vez mais como um Partido regional.

A terceira força é possível até porque quero crer que há cabo-verdianos que não se identificam nem com o PAICV e nem com o MPD. Esses sim, são capazes de estribados num projecto de sociedade credível proporem aos cabo-verdianos uma outra alternativa, porque não movidos por objectivos de revanche.

Dizia eu, que o sistema em Cabo-Verde é dominado pelo MPD e PAICV. Em Cabo-Verde o espaço de construção de ideias é totalmente dominado pelos políticos e pelos Partidos que os sustentam. É urgente o aparecimento de uma classe intelectual e académica com pensamento científico capaz de questionar esse pensamento eminentemente movido por interesses político-partidários.
Esperamos que a proliferação de instituições de ensino superior em Cabo-Verde promova a cultura de investigação e permita o aparecimento de uma classe intelectual capaz de contrabalançar essa hegemonia dos Partidos Políticos na construção de ideias.

Creio que fazer política em Cabo-Verde ainda comporta algum risco. Muitos à procura do primeiro emprego não manifestam as suas preferências políticas com medo de represálias. As pessoas tem receio de se manifestarem ou porque o filho está à espera de uma bolsa de estudo ou para não perderem o seu emprego. Existe ainda uma certa apetência para a vingança política. Os Jornalistas ou são censurados ou praticam a autocensura. O controlo social é muito forte tanto no sentido positivo como no sentido negativo.

Sonho que um dia Cabo-Verde há de atingir um nível de desenvolvimento económico em que o sector privado, mormente as pequenas e médias empresas, se afirmam como o motor de crescimento e o Estado deixa de ser o principal empregador; que todos sejam profissionais no exercício das suas funções; que a nossa democracia se consolide e não haja mais espaço para vinganças políticas; que a disputa política se faça com base em ideias e projectos; que o Estado se retire dos meios de comunicação social; que a liberdade de imprensa tenha como limite o respeito pelo outro; que todos possam manifestar livremente as suas preferências políticas sem medo de represálias; que se tolere a diversidade; que se promova a curtura do mérito e da excelência; que haja trabalho para todos; que os ricos se tornem cada vez mais ricos e os pobres cada vez menos pobres.

Quando eu realizar os meus sonhos estarão reunidas as condições para que não haja autocensura e para que haja menos anonimato. Não vejo o anonimato como algo a abolir.
Em relação às máscaras pode-se lamentar, mas não há nada a fazer. Tem a ver com a personalidade e o carácter e ainda com a questão da sobrevivência.

Apesar de eu ser um defensor acérrimo e apaixonado da liberdade de expressão, é preciso ser muito prudente nos dias que correm. O extraordinário desenvolvimento e a rápida disseminação das tecnologias de informação é propício á divulgação de conteúdos que podem incitar á violência e pôr em causa o equilibrio social.
Afinal, sempre “ a liberdade de um indivíduo para desferir um murro acaba onde a cara do outro começa."